A Burguesia e a Corrupção.
21 de abril, 2016
Por Flávio Lyra
A corrupção constitui-se num mecanismo eficiente para extrair recursos do setor público ou das famílias para o setor privado e não vice-versa. Desde logo, agentes públicos participam do processo e dele se beneficiam, porém, os grandes beneficiários e destinatários finais dos recursos originados na corrupção são os diferentes setores da burguesia, cujos lucros são aumentados com os recursos provenientes da corrupção.
A verdadeira cruzada contra a corrupção, vinculada às fraudes envolvidas no assalto aos cofres públicos, que tomou conta do país recentemente, patrocinada por empresários (e seus órgãos representativos, como a FIESP) e executada pelas grandes empresas de comunicação, através de periódicos e da televisão, deixa no ar a pergunta: QUE PRETENDEM ESSES SENHORES, SE ELES MESMOS SÃO OS PRINCIPAIS PROMOTORES E BENEFICIÁRIOS DA CORRUPÇÃO?
Existe uma expressão latina clássica, “Cui bono?” (A quem aproveita?) Atribuída a Cícero, que recomendava aos juízes procurarem o criminoso entre aqueles a quem o crime traz benefícios.
Na verdade, a corrupção tem sido um instrumento de muita valia para a burguesia brasileira. É através do financiamento das campanhas eleitorais que a burguesia, o chamado Poder Econômico, controla o processo eleitoral, escolhendo e elegendo os candidatos que vão defender seus interesses junto ao Estado.
A corrupção começa com o financiamento dos candidatos pelas empresas, com recursos de origem legal e ilegal (o chamado Caixa 2). Os recursos do caixa 2, já implicam corrupção por parte das empresas, que os acumulam fugindo à tributação. São, na realidade, recursos de origem corrupta usados para financiar a fidelização dos agentes públicos. Estes, sejam políticos ou funcionários públicos, em sua atuação criam as facilidades legais e ilegais para aumentar os lucros das empresas que executam obras e vendas para o Estado. Em realidade, o processo circular da corrupção começa e termina nas empresas, cuja propriedade é da burguesia.
Os agentes públicos corrompidos pela burguesia, especialmente os que são eleitos pelo voto popular, cumprem o papel de de ajudar a transferir recursos públicos para as empresas privadas, através do pagamento de sobrepreço (prática típica dos cartéis) nos produtos adquiridos pelo Estado. As propinas que enchem o bolso desses agentes públicos são financiadas com parte dos sobrepreços aplicados nas vendas ao Estado.
Por certo, que este é apenas um aspecto das práticas corruptas que os agentes públicos realizam em favor da burguesia. Existem, porém as práticas mais sofisticadas que ocorrem ao abrigo das leis, criadas e aplicadas para favorecer os interesses das empresas privadas em detrimento da classe trabalhadora.
As dificuldades para o país adotar políticas que tornem a arrecadação de impostos mais justa ou que controle a extorsão representada pelas altas taxas de juros, por exemplo, fazem parte da ação legal dos agentes públicos em favor da burguesia.
No Brasil, chega a ser estarrecedor que entidades comandadas pela burguesia como a Federação das Indústrias de São Paulo-FIESP e a Federação das Indústrias do Rio de Janeiro-FIERJ, usem recursos arrecadados pelo governo, incidentes sobre as folhas de pagamento dos trabalhadores destinados a programas sociais (SESI-SENAI) para financiar campanhas de candidaturas políticas (Paulo Skaf) e golpes de Estado.
Conforme evidencia a situação atual do país, o combate à corrupção pode se transformar também em instrumento precioso para impedir a chegada, ou afastar do Poder, as forças populares, mediante campanhas midiático-judiciais-policiais direcionadas a convencer a opinião pública de que são as forças populares as grandes responsáveis pelos atos de corrupção.
Por certo, que essas campanhas acabam prejudicando, também, os setores da própria burguesia que se expuseram excessivamente na posta em prática de condutas delituosas no campo da corrupção, ou que se tornaram competidores importantes no campo de suas atividades produtivas para outros setores nacionais ou internacionais com os quais disputam mercados ou recursos naturais.
Sendo conhecido que o financiamento empresarial de campanhas eleitorais é o mecanismo primordial da corrupção, os paladinos da luta contra corrupção são os primeiros a se colocar contra a proibição dessa forma de financiamento. Felizmente, o Supremo Tribunal Federal, recentemente, proibiu esse tipo de financiamento. Não obstante, veja-se a conduta recente de um dos ministros do STF, que sentou em cima do processo que proíbe tal tipo de financiamento, por cerca de um ano, para evitar que fosse concluída sua votação, que já contava com o voto favorável da maioria dos membros.
Em resumo, a corrupção constitui-se num mecanismo eficiente para extrair recursos do setor público ou das famílias para o setor privado e não vice-versa. Desde logo, agentes públicos participam do processo e dele se beneficiam, porém, os grandes beneficiários e destinatários finais dos recursos originados na corrupção são os diferentes setores da burguesia, cujos lucros são aumentados com os recursos provenientes da corrupção.
Flavio Lyra é economista da Escola da UNICAMP e ex-técnico do IPEA.
(De REDH)